A religiosidade e suas interfaces com a medicina, a psicologia e a educação
Paulo LR Sousa, Ieda A Tillmann, Cristina L Horta e Flávio M de Oliveira
Se durante séculos religião e ciência ocuparam domínios completamente separados, essa virada de milênio reservou uma reviravolta no assunto. De parte a parte, ciência e religião vêm mostrando um mútuo interesse de aproximação. João Paulo II1 marcou essa tendência na encíclica Fides et Rati (1998), em que afirma que “a fé e a razão constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade”.
Em sintonia com a abertura da igreja, numerosos cientistas manifestam não somente o desejo de corresponder ao apelo aproximativo, mas, concretamente, realizam investigações científicas sobre as variadas circunstâncias da religião na vida dos homens. Assim, atualmente é comum o desenvolvimento de pesquisas sobre a temática, tanto nos veículos especializados quanto nos meios variados da mídia.
É provável que as manifestações religiosas de Einstein, primeiramente expressas em 1950,2 sejam, de parte do mundo científico da modernidade, um dos primeiros passos facilitadores dessa aproximação. Logo, Einstein referiu que um cientista podia, efetivamente, ser um homem religioso. Ele, por exemplo, acreditava em uma perspectiva “cósmica, não antropomórfica”, de Deus. Apontava que o antropomorfismo era uma necessidade do homem comum para compreender a divindade. O cientista iria por outro caminho, mais abstrato e menos sincrético. Mas ambos (sujeito da multidão e sujeito de ciência) podiam ver-se irmanados ante a circunstância divina.
Parece que essa abertura posicionada por Einstein funcionou como um ponto de ruptura do estereótipo que incompatibilizava ciência e religiosidade no mundo moderno, embora, vale frisar, é bem defensável a idéia de que a ciência, para nascer, precisou se afastar daquilo que o pensamento religioso guardava de dogmatismo, para poder se constituir como domínio disciplinar dentro de um outro paradigma.
A partir de Einstein, reduziram-se, um a um, os impedimentos de cercania para ciência e religião, a ponto de João Paulo II afirmar que religião sem ciência não é boa religião, bem como ciência sem religião não é boa ciência. Uma posição convergente com a do sumo pontífice foi, recentemente, tomada pela Organização Mundial da Saúde3 (1998), ao ter acrescentado a dimensão de bem-estar espiritual ao seu conhecido conceito multidisciplinar de saúde, que, como se sabe, só entendia uma condição de saúde se existisse a presença de bem-estar nas dimensões físicas, psíquicas e sociais. A valorização acrescentada, considerando o lado espiritual/religioso, é, sem dúvida, o selo decisivo e universalizado do entrelaçamento de ciência e religião.
O presente estudo aborda algumas questões decorrentes das interfaces entre alguns ramos da ciência e religião: medicina e religiosidade; psicologia e da religiosidade; educação e religiosidade. O objetivo do presente ensaio é elaborar uma revisão crítica dos principais textos sobre o tema, buscando-se apontar algumas sendas para futuras investigações.